Um período para o luto

O luto é uma reação normal à perda de um ente querido ou de algo que ocupou seu lugar. De acordo com a cultura, religião, situação da perda e a relação prévia com o ente, o luto é vivenciado de maneira diversa. Consideram-se adequados desde o choro e roupas pretas, até fazer reuniões alegres com “comes e bebes” no funeral.

 

Qual o período de tempo esperado para o luto na nossa cultura?

 

Não existe um tempo exato. Contudo, sabemos que no início a pessoa perde o interesse pelo mundo externo, voltando toda a energia para dentro de si, afastando-se de qualquer atividade, revivendo as lembranças do ente perdido. É esperado que, à medida que a realidade for evidenciando esta ausência, o indivíduo vai aceitando-a. O primeiro ano é o mais difícil, pois, a cada aniversário, a realidade mostra a perda, causando piora.

 

E por que algumas pessoas parecem não sair mais do luto?

 

Diversos fatores influem: às vezes, se havia conflitos não resolvidos com o ente ou se a causa da more foi dramática e inesperada, algumas pessoas não conseguem elaborar. Ficam com uma sensação de ataque pessoal, raiva, evitando entrar em contato. Gastam toda a sua energia para manter vivo dentro de si o ente querido. Além disso, pesquisas mostram que pessoas com o luto prolongado têm ativação da área do prazer ao relembrar o morto, o que pode funcionar como uma “droga viciante”.

 

Tanto o luto precipita a depressão em indivíduos predispostos, com quem já a teve, ao sofrer perdas, pode ter um luto que não se resolve. A pessoa não consegue imaginar nenhum prazer, sentindo-se mal consigo mesma na maior parte do tempo, podendo chegar até a ter ideação suicida com risco de vida.

 

No caso de um luto complicado, que não atende à melhora, e de suspeita de depressão, a avaliação por um psiquiatra é importante, pois pode haver indicação de psicoterapia e medicação.

 

Contudo, na maior parte dos casos, entrar em contato com a dor e o sofrimento, que são inevitáveis, e ter gratidão pelos momentos vividos em conjunto ajudam a “dar um significado” e a “deixar ir” o ente perdido, tornando a vida de quem fica ainda mais rica.

 

Letícia Furlanetto

Psiquiatra e membro da ACP-Associação Catarinense de Psiquiatria.

 

Fonte: Diário Catarinense de 10/4/2018.