Simbolismo iniciático

A Maçonaria é essencialmente um exercício espiritual. Destina-se a moldar o carácter do seu praticante, fazendo dele um verdadeiro obreiro do universo. Nos templos maçônicos não se pratica uma religião, mas sim uma Arte, cujo propósito é o aperfeiçoamento do ser humano, a partir de uma forma de pensar e de um modelo de conduta, no qual se releva o respeito pela pessoa humana e o bem estar da comunidade.

Não há um modelo filosófico a ser seguido nem uma orientação religiosa imposta como paradigma. Por esta razão os seus fundamentos estão assentes em símbolos, lendas e alegorias, e a sua aprendizagem dá-se através do método iniciático, o que exige do seu praticante um espírito aberto e antidogmático, capaz de trabalhar nos territórios da matéria e do espírito com igual desenvoltura.

Método iniciático, ou psicológico, é aquele segundo o qual os ensinamentos não são dirigidos à razão do aprendiz, mas ao seu inconsciente. Por isso, os ensinamentos maçônicos não seguem a organização epistemológica própria de uma ciência ou doutrina, como seria da praxe em qualquer forma de aprendizagem. O aprendiz Maçom deve participar desses ensinamentos através de repetidas iniciações, que têm como objetivo “impressionar” o seu espírito e levá-lo, mais a “sentir” o ensinamento, do que propriamente compreender a sua lógica.

A Maçonaria é aprendida através de símbolos e alegorias que transmitem verdades morais e iniciáticas. Por isso, encontraremos nos rituais de todos os graus uma alusão a símbolos e lendas, de alguma forma conectados com os ensinamentos que se deseja transmitir.

A mitologia é a forma mais antiga que o pensamento humano encontrou para integrar os conteúdos do inconsciente coletivo da humanidade com os fatos com os quais era confrontada. Não podendo explicar a origem de um relâmpago, nem a sua força destruidora, por exemplo, imaginou-se ser o mesmo um atributo dos deuses no exercício da sua cólera contra os homens. Não concebendo a forma pela qual o conhecimento aflora dentro da mente, criou-se a imagem de um herói roubando o fogo dos deuses e dando-o, de presente aos homens.

Esta é uma referência à mitologia grega do raio de Zeus e ao mito de Prometeu, que roubou o fogo sagrado e o entregou ao homem, dando origem ao conhecimento humano. George Smith, no seu livro “Antiguidades Assírias”, assinala que todos os grandes mitos religiosos tiveram uma origem comum. Moisés, por exemplo, segundo aquele estudioso, foi uma criação do cronista bíblico Esdras, que o interpolou na Bíblia, inspirado na história do rei assírio Sargão, que semelhante a Moisés, teria sido retirado das águas do Rio Eufrates e dado início ao povo assírio. Da mesma forma o próprio mito cristão teria sido inspirado no mito persa do deus Mitra, o qual, semelhante a Jesus, também nasceu de uma virgem e veio ao mundo para salvar a humanidade.

Por se tratar de uma Arte destinada à construção do caráter humano, a Maçonaria adoptou como base da sua filosofia e como suporte do seu simbolismo os fundamentos e as ferramentas da ciência contida na arte de construir, ou seja, a Arquitetura. Daí o porquê de a grande maioria dos símbolos, alegorias, lendas, analogias e arquétipos presentes na Arte Real estarem todos ligados à ideia da construção ou da reconstrução, física ou espiritual, do edifício moral da humanidade.

Evidentemente, há, nesta questão, um fundamento histórico inegável que não se pode ignorar. Pelo fato de a Maçonaria estar umbilicalmente ligada aos antigos construtores medievais (pedreiros livres, como se chamavam esses profissionais), é claro que boa parte da sua simbologia provém desse fato. Mas hoje, sendo a Maçonaria essencialmente especulativa, isto é, análoga a uma escola de filosofia, com características de entidade filantrópica e associação corporativa, não há mais que se falar na simbologia dos antigos pedreiros em termos operativos, mas apenas como alegorias de fundo espiritual.

A Arquitetura de que se fala na Maçonaria refere-se à construção de uma sociedade justa e fraterna, onde todas as pessoas possam viver em harmonia e união. Neste, como noutros princípios defendidos pela Irmandade, ela não se afasta da proposta esotérica contida em todas as religiões, que prometem um estado interior de bem estar a ser experimentado ao nível do espírito.

E também integra uma esperança de carácter profano, buscada por todas as experiências políticas já tentadas pelo homem na tarefa de organização das suas sociedades, que é a de proporcionar bem estar e justiça para todos. Em ambos os casos, a analogia com a arte da Arquitetura é bastante adequada, pois trata-se sempre de formatar um mundo ideal. Dai ser a Maçonaria chamada de Arte Real e o Maçom de pedreiro moral. Em tudo isto se releva a arte de construir.

João Anatalino Rodrigues

Oriundo: https://joaoanatalino.recantodasletras.com.br/