Fé e Razão - o elo da humanidade.
Já de cara vale deixar claro que, neste artigo (e nos demais escritos) não há o mínimo apelo religioso ou a qualquer outra doutrina que possa se definir como crença, adoração ou idealização divinas. Justamente porque não costumo considerar questões pessoais para teses impessoais. E, além disso, não me considero adepta a nenhum dos conceitos citados. (Não por rebeldia ou moda. É só uma questão acidental. Uns acreditam, outros não - simples assim.
No entanto – e estritamente por este fato -, reconheço minha submissão (mental e, portanto, existencial) à fé, que antecede qualquer formulação lógica do ato de crer em algo sobrenatural ou não real. A fé, a qual mais serve de apoio e proteção perante ao desconhecido, é inegável, não importa a quem. Ela foi o primeiro recurso humanamente elaborado para "burlar" forças da natureza. Afinal, o amanhã nos é um mistério, tanto quanto o que vem junto dele.
As evidências que comprovam tal afirmação são muitas e, de modo geral, vêm de resquícios e estudos históricos, junto da psicologia. Hoje, fala-se mais do assunto em cursos acadêmicos que têm, como objetivo, o questionamento da história humana para compreensão do que viemos a ser.
Por isso, a fé, antecedente ao hinduísmo, islamismo, cristianismo ou qualquer outra doutrina e clero, não se restringe à religião, como muitos acreditam. Ela independe da religião, é primeira na bagagem cultural do homo sapiens. E, mais do que isso, sobrevive até os dias atuais. Aquela pimentinha no colar ou chaveiro de casa significa fé. O pensamento otimista também. Segundo dicionário Michaelis, ela é a “convicção da existência de algum fato ou da veracidade de alguma asserção”. Menos complexo do que parece, não?!
O ponto é: não importa se a fé foi, posteriormente, apropriada por conceitos ritualísticos ou mitos que, com sucesso, embasam religiões. Essencialmente, precisávamos acreditar em algum mundo sobrenatural (com porquês ainda não justificados em terra) para suportarmos a ideia de mortalidade. Afinal, o homem é o único animal consciente de sua finitude, o que o ameaça. E as memórias? As histórias? As construções ideológicas, culturais? Tudo isso não poderia ir pro nada.
E não foi.
Surge, portanto, a necessidade de criar um lugar ainda não existente, nem pertencente ao presente. Lugar tal capaz de nos assegurar do “depois-do-fim”. Daí vem a busca pelo “de onde vem” e “para onde vai” e, enquanto ela não se conclui, a fé assume a lacuna, conforta a angústia.
Ilustração representativa da época paleolítica. Na figura, replica-se os rituais de morte que se fazia - corpo posicionado como feto, representando a fé e esperança de que ele renasceria, ainda que em outra dimensão existencial.
Não há como escapar. Por mais que tenhamos a liberdade para questionar o que nos é imposto goela abaixo é importante entendermos recursos que nossa própria espécie criou, milênios atrás, para suportar a ideia cíclica e natural do começo-fim. Os estudos e pesquisas antropológicas avançaram, a tecnologia também, muitas justificativas se fizeram, mas um fenômeno permanece: nosso intrínseco ato de questionar que, por vez, nos fez temer o insolúvel e, como medida, criamos a fé. Alimentamos a fé.
Isso está em cada pequeno ato de investimento no futuro. Porque ele é incerto, misterioso, mas é menos doloroso se ignorarmos quão pouco controle temos sobre o que, quem sabe, virá.
publicado em sociedade por Jordana Bizarro.