A Trilha sonora da sua vida
A vida da gente toca muitas canções. Aprender a escutá-las dentro de nós é um exercício que não é simples, mas é necessário. Gostamos de falar que o barulho dos outros atrapalha e desvia nossa atenção. Porém, na maioria das vezes, nós é que tapamos os ouvidos para não ouvir a trilha sonora do que realmente importa. Se estivermos atentos, existe música em cada momento vivido.
Tenho madrugadas de música clássica que lavam a alma. Há uma grandeza solitária nelas. Costumo dizer que é quando abro a janela da alma para arejar certos sentimentos empoeirados. Para tirar o pó, só o clássico. Você se apega na grande valsa de Chopin na faxina da mente. Você abraça Beethoven em sua sonata noturna até adormecer. Num piscar de olhos, sente-se entre o céu e a terra.
Tenho tardes de samba que salvam histórias. Para sacudir o esqueleto. Para transformar problemas e alegrias no batuque do pandeiro. Quem estava dormindo, desperta. Quem estava cabisbaixo, sorri. Você se apega a Adoniran Barbosa para pegar o trem das onze e voltar para casa. Você abraça Cartola porque entende que o mundo é um moinho. Num piscar de olhos, você se sente mundano na roda.
Tenho verões inteiros de música pop. Aquela da diva americana que você canta sozinho ou com as melhores amigas no carro. A que tocou num momento engraçado e você não sabe quem canta. A balada romântica que você sabe de cor. Você se apega à música do guarda-costas da Whitney Houston porque o amor é maravilhosamente cafona. Você abraça Donna Summer em sua última dança como se fosse para sempre. Num piscar de olhos, você tem 18 anos novamente.
Tenho férias de bossa. Há um encantamento poético no dedilhado do violão. Você se apega a Vinicius quando ele manda a tristeza embora porque quer de novo cantar. Você abraça Tom Jobim quando ele apresenta as Águas de Março. Num piscar de olhos, você está em Copacabana na leveza de ser quem é.
Tenho momentos rock n’roll que mantém tudo de pé. Chegam pauleira, botando o pé na porta e na alma. Arranham distorções na guitarra e sacodem a cabeça até liberar toda a tensão do corpo.
Precisamos do rock para ficarmos sãos na calmaria. Você se apega a Van Halen para pula rem direção do impossível. Você abraça ACDC para chegar ao topo do mundo. Num piscar de olhos, você se sente um sobrevivente na selva urbana.
O som de mim mesma é o que mais comove.
Mais do que Claire de Lune do Debussy. Mais eo que ária de ópera famosa cantada por tenor. Mais do que música chiclete que toca na rádio. Mais do que solo de guitarra do David Gilmour. Quando escuto meu silêncio, ouço o que cada célula tem a dizer. Cada experiência. Cada tombo. Cada vitória. Cada gratidão. Acredite, não existe outra canção mais bonita que essa que só nós podemos escutar. Uma sequência única de notas musicais exclusiva. Uma melodia silenciosa que nos define o que é a trilha sonora de uma vida inteira. É essa a minha favorita!
Thais Ferreira Gattás.
thaisferreiragattas@gmail.com
Fonte: Revista "Plural" do jornal Notícias do Dia.